Conforme vos relatei no artigo anterior, a umas semanas do fim do tempo da minha gravidez, eu pedi à minha médica (na realidade praticamente supliquei) que me internasse para ter os meus filhos, pois eu já não aguentava mais a condição física em que me encontrava, e sabia que nessa fase, eles já estariam em perfeitas condições para nascer sem correrem riscos de saúde. (Os meus filhos às trinta e sete semanas não davam qualquer sinal de querer nascer.)
Finalmente, e também por constatar que eu já não estava nas condições desejáveis e aceitáveis, às trinta e sete semanas, a minha médica decidiu internar-me. Fui internada na maternidade Dr. Daniel de Matos, em Coimbra, para ser submetida ao processo de indução do parto.
Fui submetida a três induções que não foram suficientes para ter um parto natural. Tive um parto por cesariana às trinta e sete semanas e cinco dias, aproximadamente às trinta e oito semanas, e quase no fim de uma gravidez “dita” completa, o que é raro nas gravidezes gemelares. Estou convicta de que se “deixasse” a gravidez avançar, chegaria às quarenta semanas, e quem sabe, se não passava (para mim seria impensável).
Há quem pense, e mesmo quem diga, que quem passa por uma cesariana não sabe o que é “parir”. Essa mentalidade está mais presente entre as pessoas com idade avançada, mas não só, e é errada. Talvez por pensarem que é um parto completamente indolor.
Mesmo a mulher que escolhe este tipo de parto, e isso só é permitido no setor privado, não será poupada das dores do pós-operatório, assim como nas cesarianas programadas por indicação médica. Nas cesarianas não programadas, a mulher por norma, sente as dores de parto, e portanto, só não sente dor no ato cirúrgico.
A cesariana é uma intervenção cirúrgica com riscos para a mãe e bebé superior ao parto vaginal, pelo que esta deverá ser realizada em determinadas condições e segundo indicações médicas. No meu caso foi por indicação médica e após tentativas de um parto normal (cesariana não programada).
Os partos naturais também podem ser isentos de dor, desde que administrada a anestesia epidural com a devida eficácia. No entanto, a mulher sentirá as dores que antecedem o parto até ao momento da administração da anestesia. Neste tipo de parto também há um período de recuperação que é necessário, essencialmente pelo desconforto e dor inerentes ao corte do períneo.
É verdade que cada caso é um caso, e assim como há boas experiências nos partos naturais, também há as menos boas, e o mesmo acontece nos partos por cesariana. No entanto, é facto e sabido, que a recuperação do pós parto/pós operatório de uma cesariana é mais demorada, e na maioria dos casos, mais dolorosa do que a do parto natural.
Eu não pretendo fazer comparações entre os dois tipos de parto, nem tenho o intuito de valorizar mais um do que outro. Também não acho bem que o façam porque, apesar de se conhecerem os riscos, vantagens e desvantagens de ambos, cada caso deve ser avaliado de forma individual, e os dois tipos são delicados e merecem todo o nosso respeito! Pretendo sim e apenas, contar-vos a minha experiência de pré-parto, parto e pós-parto, estando ciente que esta poderá ajudar a desmistificar o conceito errado que criaram à volta do parto por cesariana, a maior parte suponho, por desinformação.
O mais importante a retirar sobre os dois tipos de parto é que em ambos se dá o fenómeno de dar a vida e devem ser realizados em condições saudáveis para a mamã e bebé, quer sejam físicas, quer sejam psicológico/emocionais.
Pré-parto: processo de indução
A indução do trabalho de parto consiste em estimular artificialmente as contrações uterinas antes de seu início espontâneo com o objetivo de promover o amadurecimento/dilatação do colo do útero e acelerar o trabalho de parto. Tive conhecimento que há diversos métodos para esse efeito. Comigo, e ao segundo dia de internamento, usaram o método da fita vaginal que consiste na introdução de uma fita comprida dentro útero que vai libertando lentamente medicação (dinoprostona), despoletando as tais contrações com dor e amadurecimento/dilatação do colo do útero. O procedimento em si é desconfortável porque estamos hipersensíveis na fase final da gravidez. Qualquer toque no local é desagradável, e como a fita tinha que ser introduzida dentro do útero, fazendo atravessá-la pelo orifício do colo, era muito incómodo e chegava a provocar dor. Por vezes, o simples toque no colo é suficiente para induzir o parto, quando não, é sempre uma mais-valia no processo de dilatação.
A maturação do colo com este medicamento é um processo que pode demorar 12-24 horas, razão pela qual a reavaliação é feita ao final de 24 horas e a fita retirada nessa altura. O medicamento causa frequentemente contrações uterinas e em muitas mulheres, desencadeia mesmo o trabalho de parto, outras e acontece muito em gestantes de múltiplos como eu, podem desenvolver contrações dolorosas, mas sem qualquer modificação, ou pouco significativa, aparente do colo uterino.
A médica responsável pelo procedimento informou-me que eu poderia começar a ter contrações a qualquer momento.
Passadas umas horas, comecei a sentir um desconforto abdominal e algumas cólicas como se tratasse de uma menstruação mais dolorosa, e assim se manteve durante todo o dia. Passado o limite de horas para o efeito desejado (24h), e não havendo sinais de que os meus filhos queriam nascer, repetiram o procedimento ao outro dia, portanto, a segunda indução. Removeram a primeira fita e introduziram a segunda. De novo um grande desconforto! Irmos àquela sala de observação era um suplício! Alertaram-me que a partir daqui as dores e contrações iriam intensificar-se. E eu cada vez estava mais expectante, ansiosa e receosa quanto às cólicas de parto insuportáveis de que a maioria das mães falava.
Após algumas horas, de facto, o desconforto aumentava. A par da indução, recomendaram-me fazer caminhadas pelo corredor da maternidade e assim fi-lo, por vezes sozinha, outras com a minha colega de quarto, que se tornou amiga.
Estas amizades são quase instantâneas e inevitáveis, pelo companheirismo, a partilha de dor, de emoções e o apoio reciproco, tão importante numa fase tão delicada. Esta amiga que ganhei na maternidade também esperava gémeos (um casal) e também estava a ser submetida, tal como eu, à indução de parto. Criei outras amizades com mamãs de outros quartos, éramos como uma família, e esta relação dava-nos força e coragem. No corredor da maternidade, viam-se muitas futuras mamãs a caminhar com o mesmo objetivo que eu, e também ansiosas pelo momento do parto. Algumas já se queixavam-se de muita dor, o que era um pouco assustador, e fazia aumentar o meu estado de ansiedade.
Eu tinha que caminhar para ajudar a acelerar o parto, mas os meus pés não me permitiam fazer grandes caminhadas porque inchavam de tal forma que eu tinha que parar.
Os dias eram passados com um desconforto cada vez maior e umas dores constantes ao fundo da barriga, como se mantivesse a menstruação dolorosa, para além das dores que já trazia de casa. À noite continuava sem conseguir dormir, pelo mau estar geral, que piorava a cada dia.
Apesar de todas as limitações, fazia questão de dar o meu apoio às mamãs que passaram pelo meu quarto (foram três), e a outras de outros quartos, tanto a nível físico como emocional, assim como também recebi. Acima de tudo havia uma enorme corrente de solidariedade entre todas, estávamos todas no mesmo “barco” e o apoio entre nós era essencial para “aliviar as nossas dores” aos vários níveis e nos sentirmos um pouco em “casa”.
As estadias das minhas colegas de quarto foram mais curtas do que a minha porque os partos realizaram-se antes do meu. Duas passaram por um processo normal sem indução de parto e uma, a minha amiga e última companheira de quarto, foi submetida a cesariana como eu. Todas as três chegaram depois de mim ao quarto, e partiram antes, porque os meus “pintainhos” teimavam em não querer sair do “ninho”.
A mais recente colega de quarto e hoje amiga, teve um percurso semelhante ao meu, em termos de processo para engravidar, o que nos levou a sentir mais afinidade uma pela outra. Partilhámos as nossas experiências e ambas sabíamos dar valor ao percurso que teríamos tido até ali. Podemos hoje não conviver como gostaríamos porque as nossas vidas são muito preenchidas, mais ainda sendo mães de gémeos, mas a amizade existe e sempre que possível mantemos contacto. Jamais esqueceremos esta “passagem” da nossa vida, e jamais nos esqueceremos. Costumo dizer que os nossos filhos são “irmãos de maternidade”! ❤ ❤
A minha amiga, estaria um pouco mais adiantada do que eu no processo de indução porque o iniciara primeiro. Ao terceiro dia do início do processo de indução, fizeram-nos uma terceira tentativa. Mais um grande desconforto a que tivemos que nos submeter e cada vez mais ansiosas por tudo o que se avizinharia. Mais um dia a caminhar, mais um dia com dores e muito desconforto, e previa-se mais uma noite terrível.
As enfermeiras nessa noite, acharam necessário dar-nos medicação para dormirmos e ajudar a atenuar as dores, pois estávamos exaustas e o parto podia ser a qualquer momento. Precisávamos de descansar e recuperar algumas forças, mas posso dizer-vos que essa foi a pior noite da minha amiga e mais uma terrível para mim porque as dores iam-se intensificando e o nosso estado em geral piorando. Quando nos iam medir as contrações durante a noite, que era de forma regular, registavam contrações cada vez mais intensas e também por esse motivo não conseguíamos dormir, apenas dormitávamos, apesar do comprimido para dormir. Dávamos voltas e voltas na cama, de vez em quando suspirávamos e emitíamos baixinho gemidos de dor e desconforto, mas tentávamos não fazer barulho, para não incomodar uma à outra. A minha amiga começou a ficar cada vez mais queixosa e a dada altura começou a sentir-se mal. Chamei a enfermeira que reportou a situação à médica de serviço e a minha amiga foi de imediato observada. Apesar de já ter mais alguns dedos de dilatação ainda não estava no ponto necessário para entrar em trabalho de parto, tinha que aguardar.
As minhas dores, apesar de mais intensas do que no dia anterior, e haverem umas mais acentuadas que outras, ainda as suportava. As enfermeiras estranhavam porque o equipamento de medição das contrações registava algumas de grande intensidade que deveriam ser responsáveis por dores fortes. Não sei se eu teria maior tolerância à dor, ou se pelo meu estado físico já tão débil e com dores antigas e arrastadas, podia ter contribuído para que suportasse um pouco melhor (!?)
A uma dada altura da madrugada, também eu fui observada pelas contrações de alta intensidade que as enfermeiras registaram aquando a medição, e pela dor e desconforto cada vez mais acentuados. Na observação a médica disse-me que já teria uns dedos de dilatação, mas que não eram suficientes para entrar em trabalho de parto. Estávamos ambas a sofrer e, apesar dos receios, estávamos ansiosas que a hora do parto chegasse, que nos comunicassem que a “nossa hora chegou”.
De manhã, tomámos o pequeno almoço e a minha amiga foi levada para o bloco de partos para tentarem o parto natural pois já tinha uma dilatação considerável. Pelo que me contou posteriormente, no bloco de partos ainda fizeram mais uma tentativa de indução por meio intravenoso e sofreu mais ainda. Como não resultou, optaram por fazer o parto por cesariana.
Esse dia e noite passei-os sozinha no quarto (sem a minha amiga e companheira de quarto), mas com esperança que a qualquer momento me chamassem para ter os meus bebés, o que só aconteceu ao outro dia. A noite que antecedeu o meu parto, posso dizer que foi a pior que tive na maternidade. Aí senti dores intensas, apesar de não serem constantes, e um grande mau estar, ao ponto de me contorcer na cama por diversas vezes. As enfermeiras deram-me de novo analgésicos orais e um comprimido para dormir para eu conseguir passar melhor a noite, mas pouco ajudou e foi mais uma em branco. Questionava-me muitas vezes que, se reunisse condições para fazer um parto natural (a dilatação necessária), com a falta de forças que sentia, como teria forças na hora da expulsão, e mais tratando-se de dois bebés. Acho que os médicos também perceberam que já não podiam exigir mais de mim e fazer-me esperar mais, estaria no meu limite! No dia seguinte, 14/03/2017, ainda tomei o pequeno almoço e pelas 12h fui levada para o bloco cirúrgico para realizar a cesariana.
Os meus filhos nasceram às 13h04 desse dia. ❤ ❤
Fui submetida a uma cesariana, mas posso afirmar que conheci as dores de parto. Não sei se experimentei as dores mais intensas, mas experimentei mais e menos intensas, sendo que a intensidade da dor é relativa e não é comparável, porque depende da tolerância à dor de cada pessoa e da forma como lida com esta. No entanto, é importante salientar que, não se é mais ou menos, melhor ou pior mãe, consoante o nível de dor que se sente ao parir!
Ter um filho é uma dádiva da vida, eu tive em dobro! ❤ ❤
