Entrada na escola primária

Hoje, escrevo esta carta aberta com uma mistura de sentimentos: orgulho, alegria e uma pitada (grande) de preocupação, à medida que vocês embarcam nesta emocionante jornada da escola primária.

Este é um momento especial nas vossas vidas, um passo importante para um mundo novo de aprendizagem, amizades e descobertas. Quero partilhar alguns conselhos e expressar algumas preocupações que tenho enquanto vocês começam esta nova fase da educação.

Parece que foi ontem que vos deixei no infantário, e hoje já estão na escola primária. O tempo voou, e fico emocionada ao ver como cresceram, como se tornaram independentes, resilientes, mais confiantes e seguros, responsáveis, entre outras. Sinto-me orgulhosa por cada conquista vossa.  Acima de tudo ver que são umas crianças saudáveis e felizes!

(Alguns momentos da creche à pré.)

(1º dia de aulas – escola primária. O Diego estava ansioso e expectante, o Rubim entusiasmado e curioso.)

Antes de tudo, não quero que pensem que o objetivo da escola é tirar boas notas, o importante é aprender e brincar. Eu sei, parece tão fácil! Mas nós adultos temos a mania de tentar medir tudo e tornar tudo o que é fácil mais difícil. E por isso, peço-vos que não se deixem apanhar por esta armadilha. Enquanto estiverem a estudar ou a ouvir a professora, não se preocupem com as boas notas, aprendam com gosto e entusiasmo, há tantas coisas interessantes para aprender. A preocupação com as boas notas será mais à frente.

Saibam que nem tudo se aprende sentado na sala de aula. Quando a professora vos pede para arrumarem a vossa mesa, estão a aprender. Quando a auxiliar vos pede para fazerem as pazes com um colega, estão a aprender. Quando um colega partilha algo convosco, estão a aprender. E todas estas aprendizagens são tão importantes como as aprendizagens de sala de aula.

Aproveitem este ano e os que restam da escola primária para absorverem tudo o que está à volta, e desfrutem cada bocadinho do caminho.

Não se inibam de chorar quando se magoarem e/ou estiverem tristes e de se irritarem quando se sentirem zangados. Entendam que algumas situações metem um pouco de medo e peçam sempre ajuda quando precisarem. Vivam cada minuto deste ano letivo ao máximo. O poder de fazer este ano um dos melhores anos de sempre, está também nas vossas mãos.

E digo isto porque a escola é cada vez mais “só” escola. Programas, metas curriculares, fichas de avaliação e exames nacionais. Quadros de honra. Trabalhos de casa, trabalhos de férias. É como começar uma corrida, carregados com uma mochila de livros em que o que interessa é chegar à meta o mais depressa possível. Não se pode abrandar o ritmo, nem pousar a mochila para descansar. Se perdermos tempo a ajudar alguém já não se chega nos primeiros lugares, e muito menos podemos, pelo caminho, apreciar a paisagem. Não há danças, brincadeiras e distrações, é sempre em frente e com a maior velocidade possível.

Se formos todos educados neste espírito de competição e num ritmo desenfreado, e não aprendemos a parar para apreciar a natureza, brincar, conversar, então muito provavelmente, esta corrida vai durar toda a vida. O nosso sistema de educação, constato, é um grande impulsionador desta “corrida”. Há muito a melhorar!

Como não quero que entrem nesta corrida, ou pelo menos em idade tão tenra, e com tanto para desfrutar, quero que saibam que ir para a escola e aprender é importante, mas não se limitem às metas curriculares, não precisam ser os primeiros no quadro de honra.

Acima de tudo, aprendam a ser felizes. A conversar com os amigos, a saltar à corda e a jogar à bola, a brincar… A olhar para as árvores, as flores, os passarinhos. Continuem a ser educados e simpáticos com todas as pessoas, e a ajudar quem precisa.

Passados 5 meses de iniciarem o ano letivo, fico impressionada com a vossa capacidade de adaptação a esta realidade tão diferente da que conheciam. Admiro a vossa sede de aprender e o entusiasmo com que se envolvem nas novas tarefas.

Nesta nova escola têm que ser vocês a ter o cuidado de vestir o casaco se estiver frio ou a colocar o chapéu em dias de sol, na hora do recreio. Têm que ser vocês a não esquecer de beber água, comer fruta e a lavar as mãos antes das refeições. Não têm quem vos limpe o rabiosque, nem quem vos dê o afeto que estavam habituados na pré. Também aqui não têm a mesma proteção, supervisão e cuidados que tinham na pré.

A entrada para a escola primária é um período em que começam a assumir responsabilidades por si mesmos, aprendendo a cuidar das suas necessidades e a tomar decisões independentes. Apesar desta mudança preocupar os pais, a mim deixa-me de coração apertado, também sei que esta etapa marca o início da construção de uma base importante para o desenvolvimento pessoal, incentivando a autoconfiança e a capacidade de lidar com desafios. Neste percurso, as crianças desenvolvem habilidades que serão essenciais ao longo da vida, preparando-se para enfrentar o futuro com uma mentalidade autónoma e resiliente.

Nesta nova escola, a hora de brincar é muito mais agitada porque são muitos meninos de várias idades, alguns mais velhos, e as brincadeiras têm que ser criadas por vós recorrendo à vossa incrível imaginação. Não têm os brinquedos e entretenimentos que tinham na pré, nem há a hora de conto e de acalmia.

Há uma campainha que toca para entrar e sair da sala, há regras e horários diferentes e mais exigentes.

Tanta responsabilidade, conhecimento, dinâmicas e regras para assimilar num curto espaço de tempo. Aqui, o nosso sistema educativo mostra lacunas, pois esta mudança deveria ser gradual e mais suave. Deveria haver um período de adaptação tanto para as crianças quanto para a escola. Sim, essa adaptação deveria ocorrer nos dois sentidos, exigindo esforço de ambas as partes, não apenas das crianças e dos pais. Isso tornaria o processo mais fácil e a integração mais suave e agradável. Um tema que abordarei em futura publicação neste blog.

Apesar de todas essas dificuldades e novidades, vocês estão a acompanhar, a aprender, e a adaptar-se sem reclamações. Quando pergunto se estão bem e se tudo corre bem, respondem que sim. Apesar de haver dias que deixam transparecer a ansiedade, o cansaço e a inquietação, estados normais e comuns desta nova fase. A vossa capacidade de adaptação e aceitação a esta mudança emociona-me e enche-me de orgulho.

No entanto, preocupa-me que ainda não compreendam que nem tudo é normal ou deve ser aceite quando entramos num processo de mudança. Não devem pensar que, por estarem num ambiente diferente com regras distintas, tudo é normal e aceitável.

Cabe a nós, pais, fornecer as ferramentas necessárias para que possam discernir o que é correto do que é incorreto e o que devem ou não aceitar.

Não é correto, nem devem aceitar que vos desrespeitem. Não é correto, nem devem aceitar que vos forcem a fazer algo que não gostam ou que vos cause desconforto. Não é correto, nem devem aceitar que vos tratem mal, seja de natureza física ou psicológica, quer provenha de um adulto ou de outra criança. Entre outras situações não aceitáveis que vos iremos transmitindo ao longo desta etapa, da vida.

O sistema de educação atual não é dotado de recursos humanos, técnicos e outros que lhes permitam identificar e abordar situações de risco entre as crianças, nomeadamente o bullying, entre outras, o que a mim me preocupa muito e me deixa insegura.

Acredito que investir em medidas que permitam uma atenção mais personalizada e a identificação atempada de problemas, pode contribuir significativamente para a criação de um ambiente escolar mais seguro e propício ao desenvolvimento saudável das crianças.

Termino esta carta com alguns conselhos para levarem convosco nesta nova caminhada e para a vida:

  • Vocês farão novos amigos na escola. Lembrem-se de que a amizade é uma parte valiosa da vida. Sejam gentis, prestativos e estejam abertos a novas amizades. Mas lembrem-se de que nem todas as pessoas são iguais, têm que aprender a respeitar e a lidar com a diferença, e muito importante também, devem ser respeitados. O respeito e a empatia é a base para qualquer relacionamento saudável, de amizade, de namoro, de trabalho ou qualquer outro.
  • Se algo vos preocupar ou tiverem dúvidas, não hesitem em partilhar connosco. A comunicação é fundamental, e estamos sempre aqui para ajudar.
  • Respeitem os vossos professores, colegas e as regras da escola. Tratem os outros da maneira como gostariam de ser tratados.
  • Aprender a equilibrar o tempo para a escola, família e lazer é uma habilidade importante. É importante não esquecer de fazer os trabalhos de casa, mas é importante também que tenham tempo para brincar. Nós vamos ajudar-vos a fazer esta gestão da melhor forma possível.
  • Lembrem-se de que cada um de vocês é especial e único. Valorizem-se e acreditem em vós mesmos. Ninguém tem o direito de diminuir a vossa autoestima ou fazer com que se sintam mal.
  • Se se sentirem desconfortáveis com alguma situação ou tratamento, comuniquem aos vossos pais, aos professores ou a outra pessoa de confiança. A comunicação é essencial para resolver problemas.
  • Mantenham-se fiéis aos vossos valores e princípios. Não sigam más condutas apenas para se integrarem. Se algo não parecer certo, tenham a coragem de dizer NÃO e fazer a coisa certa. Os amigos de verdade respeitam-vos como vocês são.

Os papás dar-vos-ão as ferramentas que acharmos necessárias e transmitir-vos-emos os valores que defendemos e achamos importantes para poderem fazer escolhas sábias e manterem a vossa integridade. Estamos aqui para vos apoiar em cada passo do vosso caminho para que possam crescer como indivíduos felizes, respeitosos e confiantes. Lembrem-se sempre de que somos a vossa maior fonte de amor e apoio.

Ficaremos felizes com as vossas conquistas e faremos-vos ver que a cada derrota terão uma nova oportunidade, sendo que o mais importante é que sejam felizes! ❤

Com muito amor,

Mamã